Se quiser participar, é só mandar um e-mail pra organizadora em juliadantas@gmail.com pra combinar uma data pro teu relato. Os participantes estão em Porto Alegre ou abandonaram a cidade temporariamente para a quarentena.

4.4.20

Dia 18: por Lucas Cassales

Há um mês estreávamos nosso primeiro longa-metragem nos cinemas.

Um trabalho de alguns anos que finalmente ganhava sua janela mais tradicional. Durante as sessões de pré-estreia, em São Paulo, já ouvíamos os primeiros casos pipocando na metrópole e um medo que ainda parecia coisa de gente histérica.

Na quinta-feira, em Porto Alegre, o filme entrava em cartaz e a campanha de divulgação da distribuidora estava a toda. Na sexta, todos os cinemas do Rio de Janeiro estavam fechados, por decreto do Wilson “comemorando mortes e ainda assim sendo minimamente prudente” Witzel.

Meu primeiro pensamento foi “puxa, precisamos dar um gás no filme antes que todos os cinemas fechem”. No sábado ainda dei uma puxada em grupos de amigos, dizendo para verem logo antes que o vírus se alastrasse. No domingo, fui para uma sessão debate já marcada em Curitiba, receoso. Debate esvaziado, meu nível de ansiedade já bastante cheio.

Meu voo de volta, no dia seguinte, desmarcado e meu voucher remarcado para um voo mais tarde. A Azul começava a cancelar vôos e empacotar gente na menor quantidade possível de aviões.

No aeroporto, muita gente com medo no olhar e máscara na boca.

Aliviado por chegar, nos reunimos com a distribuidora e a ficha finalmente caiu: não havia a menor possibilidade de pedirmos pras pessoas irem aos cinemas. O acaso havia nos presenteado com uma das piores datas para estreia: a ascensão de uma pandemia mundial no Brasil. Pouco a pouco, os cinemas de Porto Alegre também fecharam. Curiosamente, o filme foi bem (dentro do contexto), em salas de shopping, e seria renovado para mais uma semana, se não fosse o decreto do Marchezan (corretíssimo, obviamente), que os impediria de abrir.

Vida que segue, entrei imediatamente em isolamento também. Saio apenas para levar lixo, pegar encomendas de compras da Fruteira do Dedé e para levar algumas delas para o meu pai.

A batalha na minha mente tem sido entre lembrar do privilégio que é estar numa casa arejada, ensolarada, sem precisar sair para trabalhar, com comida saudável, com a pessoa que amo; e  temer por tudo que virá: pelo meu pai, pelo medo de infectar e de ser infectado tendo doença respiratória, e muito por ter um dos seres humanos mais desprezíveis que já pisou na terra presidindo o país e sendo o legítimo rei midas da merda.

Não esquecendo das lutas que podemos lutar, mas tendo um pouco de consciência da nossa impotência.

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