“Pode levar, não custa nada... Ela não passa deste domingo”. E assim - em um sábado ensolarado no brique da Redenção - começou minha relação com a sensitiva-dorme-dorme. Como professora de artes nada mais concreto para ensinar crianças a respeitarem a natureza do que colocando-as para tocar a dorme-dorme/sensitiva/treme-treme... Basta um ligeiro pousar sobre qualquer parte do seu corpo para que suas folhas se recolham... Mostrando que sente e que está muiiito viva. Hoje, mora aqui em nosso apartamento.
Primeira turma atendida na sala 33 em 1998. Crianças de seis a sete anos, sendo meu primeiro contato com a realidade do bairro Mario Quintana. Um dos mais violentos de Porto Alegre. E já tínhamos inclusões não declaradas na matricula. Alunos cujo comportamento beirava a internação e/ou isolamento social parcial tamanho potencial destruidor que tinham. Uma sala de madeira, com cupins e com a fala de que seria uma sala provisória... Temporária, que não era viável investir nela, pois seria com certeza destruída. Todo ano no retorno das férias – inicio do ano letivo - recebia o “tens mais um ano nesta sala”.
E aqui esta a desenganada dorme-dorme/treme-treme... Quase um ano depois de ser entregue para sair deste mundo para outro nas minhas mãos. Se fiz alguma coisa?... Nada. Apenas ignorei o comentário, fiz regas regulares, podei, tirei alguns parasitas e troquei a terra. E quase diariamente olhava para ela para ver o que estava acontecendo... Se desenvolvendo... Crescendo! Florindo!
E lá, distante de mim, segue a sala temporária-provisória. Vinte três anos nesta condição de desenganada. Não passa deste ano. Se investimos nela? Sim... Algumas direções, assim como eu, acreditavam! Mesmo diante de ondas negativas e muito pessimistas. As que acreditavam colocaram tanque, torneira, bancada para as aulas de tintas... Fizeram estantes, cortinas, pinturas e colocaram um quadro branco novinho. As que não acreditaram fizeram que saísse de meu bolso o valor das tintas e das reformas. Porque depois de três meses tentando que seu gestor pinte a sala onde você trabalha em um órgão público por estar inabitável, ou você se aposenta trabalhando em um lugar horrível visualmente, ou você compra a tinta e pinta. E assim nasceu também o jardim... Para recuperar os violentos, acalmar os hiperativos, e devolver a paz ao meu olhar toda vez que minha alma cansada
pensasse em desistir. Uma janela para o verde e para sala 33... De artes!
Hoje, aqui e lá, com uma previsão de estado de isolamento social estabelecida e sem prazo para encerrar fico a pensar que somos de alguma forma desenganados de nosso amanhã... De nosso futuro. Assim como a dorme-dorme/treme-treme e a sala de artes provisória-temporária por 23 anos, vou permanecer sem considerar esta sentença: desenganados. Vou fazer valer o tempo da existência... Vou florir sim, dentro de quatro paredes... Vou criar sim, dentro de quatro paredes. Com a mesma intensidade e vontade de todos os desenganados do mundo... Esperando para acontecer? Não, acontecendo! Em pinturas, criações literárias, criações culinárias, criações... Por que isolamentos, julgamentos, não podem inibir o que de melhor existe em mim... Em você... Aquilo que grita internamente para acontecer... A vida e a energia presente em nossas mãos e mente!!
Que linda história de perseverança, insistência ou fé... É o que a gente precisa pra esses tempos tão difíceis... Obrigada!
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