Se quiser participar, é só mandar um e-mail pra organizadora em juliadantas@gmail.com pra combinar uma data pro teu relato. Os participantes estão em Porto Alegre ou abandonaram a cidade temporariamente para a quarentena.

12.4.20

Dia 26: mariam pessah

Quando começou a quarentena, bem no início ainda, lembrei da festa de Pessah. Como limpávamos naquela época! Muita gente deve de continuar a limpar ainda hoje. Limpar, garimpar até a última migalha de pão abandonar a casa. Assim me sinto nestes dias. Desde o início limpo loucamente até sentir que tiro a coro(n)a do vírus. Vou pra rua muito eventualmente. Se não fosse tal a função da limpeza, será que eu iria mais seguido? Onde começará o real Covid e onde continuará nossa neura 19?

Teve um dia que quase surtei. Clarisse tinha descido na casa da vizinha, no 1º andar. Ao voltar, continuou caminhando pela casa com os mesmos sapatos com que tinha subido e descido as escadas do prédio. Ao ver, gritei: os sapatos! Tira os sapatos! Enquanto gritava, e ela me descia que eu estava muito nervosa, passava pela minha mente um vírus invisível e ao mesmo tempo tão omnipresente. Ele podia estar ou não. Ela podia estar levando o vírus ao banheiro, ao quarto, à sala. Ou não. Como saber? Essa falta de resposta me mata. Como saber se eu mesma tive coronavírus num país que não faz o teste, exceto para quem estiver morrendo.

Dias atrás, num daqueles momentos deprê, cheio de perguntas, peguei o livro Vozes de Tchernobil. Tem horas que penso que estamos vivendo a pior época, depois, penso que o mundo já passou por tantas... Holocausto, Tchernobil, escravidão de pessoas negras, assassinato dos povos originários. Plano Cóndor. Feminicídios… Não. Definitivamente, não estamos no pior momento, estamos em mais uma volta cíclica da humanidade passando por um daqueles momentos. Só que uma coisa é ler nos livros de história, nos jornais, ouvir nossxs antepassadxs contando; outra, estar protagonizando o momento histórico. Por isso fui buscar o livro de Svetlana. Ela, já no início, fala de um signo chamado Tchernobil ainda não compreendido. Fala também do mistério. Bueno, quis dizer a ela, você não está me ajudando muito. Mas é isso. O mundo, a vida se compõe de perguntas.

Qual a compreensão desse signo que deverá um dia ser compreendido do coronavírus, assim como o Brasil ter elegido um genocida para presidente que vai tomar refri na padaria e alega que pode fazê-lo porque ele é livre, enquanto que o mundo inteiro está confinado dentro das suas casas. 

Eu passo de estar bem, até super bem, mas rapidamente posso chegar ao ponto de nada fazer sentido. Fico limpando, me mexendo. Nestes dias especialmente, devo de ter recebido a “minha festa” de Pessah e por isso passei 3 dias virando a casa, estantes, gavetas. Mas quando paro, às vezes sinto uma dor tão intensa… Essa dor foi a que me levou às Vozes de Svetlana Alexievich. Preciso entender, ouVIR o signo da nossa época.

2 comentários:

  1. Oi! Escreve um e-mail pra mim em juliadantas@gmail.com e a gente combina um data pra tu mandar teu relato :)

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